Blozonov era rico, muito rico,
mas não fora por trabalhar muito ou ter algum dom artístico e feito uma
brilhante carreira. Blozonov era rico porque como todo o indivíduo que não
herda e enriquece, era um ladrão. Não, não um desses pilha-galinhas ou mesmo um
habilidoso carteirista ou assaltante de Bancos. Aliás hoje em dia são os Bancos
que assaltam. Blozonov fez fortuna como é de regra fazer-se fortuna a roubar o
Estado. Quando se deu o colapso da União Soviética, ele “nacionalizou” em seu
favor algumas propriedades coletivas, ou seja que pertenciam ao Estado.
É sempre bom, de vez em quando, o
Estado andar assim perdido sem autoridade, para que uns indivíduos como
Blozonov possam ter uma oportunidade de se tornarem uns oligarcas. Claro que
não foi sozinho que o conseguiu, teve de haver umas cumplicidades, uns jogos de
cintura e uns idiotas úteis, mas depois tudo se resolveu em seu benefício e à
cautela meteu logo algum dinheiro no estrangeiro. O dinheiro não conhece pátria
e ficar assim onde se ganhou podia ser a tentação de alguém mais ladrão do que
ele. Ou então algum patriota decidido a fazer voltar ao Estado o que dele tinha
sido. A sorte de Blozonov foi nesse época gloriosa para todos os candidatos a
oligarcas, haver muitos! Alguns até com ainda mais ambição que ele ou vivendo
em zonas mais favoráveis e ricas.
Finalmente veio um patriota que
lhes tornou as coisas claras: Desde que não fizessem muita merda e não se
metessem na política ele deixava-os governar-se com o saque. Mas um pé fora do
risco e ficavam sem nada. Alguns tentaram desafiá-lo e com o seu poderio
económico quiseram também a parte política. Azar! Processos relativos a fuga
aos impostos e rapidamente acabaram na prisão, pelo menos os que não
conseguiram fugir a tempo para Londres, que desde que o roubo fosse fora das
terras de Sua-Majestade, não se importava de lhes receber as fortunas.
Blozonov ganhara tanto dinheiro
que desenvolveu certas bizarrias tão típicas de quem não consegue resolver
todas as psicoses que adquire. Blozonov tinha uma relação violenta com os
telemóveis. Gostava deles, mas às vezes eles não se comportavam como ele
esperava, ou não lhe davam as notícias que ele queria. Ele tinha um mau
acordar. Os seus empregados, procuravam não manter muito contacto com ele após
o seu acordar. (Acho que é um traço comum a todos os psicopatas…) Mas já se
tinham habituado a perguntar-lhe:
-- Torradas ou cacete, Senhor?
Se ele acenasse com a mão queria
dizer torradas, mas se abanasse o telemóvel na sua mão direita queria dizer
cacete. Um dos seus guarda-costas, neste último caso entregar-lhe-ia um bastão
de basebol, enquanto ele lhe passaria o telemóvel para a mão. Depois numa
espécie de coreografia previamente encenada, o guarda-costas procuraria
lançar-lhe o telemóvel que ele tentaria acertar com o bastão de basebol. Nem
sempre lhe acertava e nesses casos, pularia com evidente ataque de fúria, sobre
o telemóvel a pés juntos até este ficar irremediavelmente perdido.
Claro que Blozonov usava sempre
os mais caros telemóveis. Não por causa das características, que a maioria não
usava, mas pelo status que conferiam. A principio os seus empregados observavam
a cena estarrecidos mas sem protestarem, não fosse Blozonov usar-lhes a cabeça
com o taco! O tempo foi passando até que algum deles se lembrou de trocar o
telemóvel novo por um que já antes tivesse conhecido destino semelhante,
enganando Blozonov que pensava estar a largar a sua fúria no telemóvel culpado
e não num que já havia sofrido semelhante sentença. Assim todos os empregados
acabaram a ter telemóveis de topo de gama, coisa a que com os seus magros
salários nunca poderiam chegar. Blozonov era rico, mas capitalista convicto e
por isso nunca pagava salários altos. Depois os empregados compravam umas capas
para disfarçar e a coisa tinha corrido bem, com benefícios para todos os
envolvidos. Blozonov também era ligeiramente míope, mas recusava-se a usar
óculos ou lentes de contacto o que também facilitava.
Mas quis um dia que um empregado
menos dotado de inteligência, lançasse um telemóvel com uma capa cor de rosa.
Blazonov nunca usaria um telemóvel com uma capa cor de rosa e de imediato
reconheceu que ali havia qualquer coisa fora do lugar.
Felizmente um outro empregado,
mais dotado de cérebro e anterior carteirista, apanhou rápido o telemóvel de
capa cor de rosa, trocando-o pelo de Blozonov e que tinha sido temporariamente
safo do martírio. Blozonov olhou para o telemóvel que lhe foi entregue
reconhecendo-o como seu mas perguntou:
-- Então e qual era o cor-de-rosa
que vi?
-- Era o meu… -- disse o
empregado carteirista – Sua Excelência deve ter visto o meu.
Blozonov continuou na dúvida, mas
já tinha o seu telemóvel na mão e sem apelo nem agravo decidiu executar-lhe a
sentença, colocando-o em cima da mesa e mandando-lhe uma tremenda tacada que o
fez entregar a alma e as tripas. A chávena de porcelana e o pires que estavam sobre a mesa para o pequeno-almoço, em
solidariedade também saltaram e acabaram em cacos no chão.
Criaturas como Blozonov tem este
dom de fazer tudo em cacos.
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