01 dezembro 2003

Droga


Escrevia como outros bebiam, ou fornicavam. era uma droga. Um escape do labirinto interior que se atafulha com vivências sentidas de todos os modos errados. Como um rato no labirinto tentando aprender o caminho da saí­da. A única forma de sair deste, é deitado com os pés juntos.
Procurando nas suas memórias os sentimentos, cristalizava-os em palavras com nenhum sentido, ou com todos, tudo dependia da ressaca. Descobria que a sua intelectualidade provinha do seu amor pela dor, por isso era negra a sua escrita, mais negra do que os caracteres que se alinhavam disciplinados na tela em branco. Era uma escrita de amargura, tão dolorosa quanto uma prostituição forçada, por causa do ví­cio da droga. A sua droga era tão abjecta quanto todass demais podem ser. Era uma violação de si mesmo, um rasgar em dor, uma dor que por ser tudo o que achava que tinha, se tornara num hábito masoquista.
Como se houvesse prazer no sofrer, como se o misticismo da vida se transubstanciasse naquela dor da escrita em puro prazer. Era um trapo, um resto dos seus restos, que ainda respirava, arfando em palavras de vento.
Parecia-lhe outra vez sem sentido, como se a vida fosse uma mera futilidade. E achava que todos estavam igualmente condenados!
Não havia qualquer saí­da. Era um bêbado de vida, e vivia para esquecer o que a vida era, nessa agonia de se enfrentar a si mesmo todos os dias, e não gostar do que via!
Para onde rumar? Que outro 'eu' construir, senão sabia como tinha chegado ali, ou ainda mais importante, não sabia como escapar do labirinto, onde como o rato o deixaram à procura da saí­da. Talvez um rato tivesse ainda mais sentido do que ele. Escrever era por isso o único sentido que lhe restava, como o naufrago que na ilha deserta lança mensagens ao mar, na esperança de um dia...
E os dias passavam iguais ou piores, e a cada um que passava, escrever-lhe custava-lhe cada vez mais. A droga precisava aumentar de dose, ou descobrir outra mais forte!
Seule- Touluse Lautrec
Mas que outra haveria, para além da dor? A dor redimia-o de todas as asneiras, de todas as futilidades, eram como o castigo que paga a dí­vida! Mas como pagar a dí­vida de viver? Que castigo seria suficiente?
Tentou escrever mais um pouco... E nada saí­a, como se o tormento devesse refinar-se.
Tinha inveja dos que caiem de bêbados julgando que estão de pé, ou dos que têm sorte e afogam as angústias entre as pernas profiláticas de uma mulher terapeutica!