29 janeiro 2019

"Reset"



O tempo ia frio, o que não era de admirar já que estávamos no Inverno. Mas não era apenas o frio, eram as pessoas frias, numa visão utilitária das amizades. Tudo é medido em termos utilitários. Se não és um elemento produtivo és um inútil, pelo que esta sociedade não suporta fracos. Não suporta velhos. Não suporta pobres. E nem sei bem se tolera crianças, que estas acabam sublimadas como pequenos príncipes. São portanto obras de ficção, até acordarem um dia...


Nada faz sentido neste mundo em que tudo é mentira. Dantes também era, mas não era tão evidente. Hoje, as elites escarrapacham o que são. Mas o QI diminuiu bastante, e é uma caricatura do Admirável Mundo Novo de Aldous Huxley. Os idiotas arrebanhados em currais coloridos regurgitando o que lhes enfiaram pelas goelas abaixo sem qualquer sentido crítico. E se existe torna-se cínico, considerando o sofrimento humano, como um mero colateral, ou na novilíngua uma externalidade.


Será que para esta humanidade haverá esperança? Não. Nem para os que ainda lutam contra a maré das hipocrisias que engolem tudo. Nem para as Elites que numa espiral vertiginosa se precipitam para o fim da história, não por alguma hegemonia de pensamento, mas porque o seu pensamento de tão grotesco e anti-natural só pode levar a uma extinção em massa. No axioma de que todas as espécies estão a prazo. Mas a que fica, a que resistirá a este fim, não será humana, nem descendência da Elite. Talvez a Terra fique entregue aos insetos, e destes um dia algum consiga produzir uma cultura. Não faço ideia do que o futuro trará, porque ele tem vontade própria e não é domesticável, é uma besta selvagem e vai para onde quer e como quer. Sempre sonhei ser futuro, mas a história foi-me petrificando e um dia serei apenas pó.


Deixámos que os psicopatas ocupassem o poder e serão eles que nos hão-de exterminar. Não que se preocupem com isso, que a sua arrogância e presunção é maior que o seu medo de morrer, maior do que o seu instinto de sobrevivência. Quando alguém se acha intocável, inatingível, então o risco que corre é cada vez maior, até que um dia é um risco demasiado grande, daqueles que acaba com a espécie. A natureza gosta de brincar aos paradoxos. Insiste nisso. Acho que tem a estranha noção que só os paradoxos geram realidades novas. E são estas realidades que nos levam a questionar e a querer saber. Quando uma espécie julga saber tudo, ser dona de tudo, mete-se num evolutivo beco sem saída. Acho que já lá estamos há algum tempo.


Estamos doentes, terrivelmente doentes e nem nos apercebemos. Um mundo em que metade de toda a riqueza do mundo está na mão de vinte e seis criaturas, só pode ser fruto de uma sociedade extremamente doente em sentido ético. E aos religiosos sempre com a moral na boca, admiro-me como o fato não lhes queima o coração! Talvez não o tenham. Ou talvez esteja tão insensível que não lhes serve de compasso, uma consciência anestesiada, própria de ovelhas que se conduzem ao abate.


Alguns choram as vítimas do nazismo, sem se aperceberem que são cúmplices de milhares de vítimas que morrem por outra ideologia, esta que acha normal vinte e seis bestiais criaturas detenham a riqueza de metade do mundo! Não ver a obscenidade da situação é sinal de que já se morreu e há muito! Hão-de morrer essas vinte e seis bestiais criaturas, vítimas da sua abastança. Porque se assim não for, a natureza não soube cumprir o seu papel, restabelecer o equilíbrio, ou na impossibilidade recomeçar de novo.

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