Sem que o vento sopre a ferida
Peguei no livro ao caso e desfolhei as páginas. Mas não me apeteceu ler e olhei o mar que se tingia de dourado num pôr-de-sol magnífico. Magoava-me mas não consegui deixar de olhar. Magoava-me a tua ausência, e de não poder partilhar a beleza do mundo contigo. Estavas distante, na distância que nos separava e também na situação. Agora eu estava livre e tu não.
Como sarar a dor que se me abria no peito? Essa ferida uqe latejava, toda ela feita da tua ausência? Como poderia resistir? Tudo o que era belo no mundo trazia a tua recordação, e a tristeza lembrava-me o teu consolo! A vida tinha destas coisas, de se transformar num inferno, quando o único pecado era amar!
Fui passear pela praia e deixei o livro no banco do passageiro... No que te pertencia por direito, e também ele me lembrava que estavas ausente. Era um espaço vazio com reserva, como as mesas dos restaurantes com marcação. Até essas coisas simples, como comer, me lembravam de ti, do teu prato preferido, do teu jeito de pegar no talher ou saborear algo. Quem dera que eu pudesse ser o teu sangue, e que eu circulasse nas tuas veias... Decidi andar pela praia, e logo que pus lá os pés, lembrei-me do teu corpo...
Deixei as pegadas na praia deserta, na esperança que as seguisses. Olhei o mar violento e espumante, com uma força que senti de raiva, de raiva por não estares! Ou talvez fosse ele a minha voz a clamar por ti.
Deixei que o vento soprasse no meu rosto, tanto quanto quisesse, e nem ele na sua boa vontade conseguiu soprar a ferida...