A história que durante tanto tempo (anos!) aqui acompanharam, está finalmente em livro!
Podem comprar em vários lugares tais como a WOOK, a Bertrand, a FNAC, etc.
Em Dezembro fará um ano do seu lançamento!
Foi no Porto, na FNAC de Santa Catarina
P.S. - Se quiserem que vos autografe um exemplar, têm de me pedir para o meu email.
Só eu me basto a esta solidão que me transforma numa ilha
rodeada de gente por todos os lados. E mesmo assim só, olhando firme o
horizonte que se estende quietamente diante de mim e a que chamam futuro.
Só eu me basto a este calor breve no meio da neve. Como tristes
icebergs que se vão afastando dos pais e rumam no mar da existência, onde aos
poucos nos vamos diluindo. Passando de uma rigidez juvenil à flacidez dos dias
finais. Só o tremor permanece.
Só eu me basto a este despertar em que me mantenho pelo receio
de não ter aprendido nada e chegar o sono eterno, que nos faz esquecer tudo,
com uma rapidez maior do que alguma vez pensámos. Na morte de cada um,
enterram-se memórias irrecuperáveis. E a vida é só memória.
Só eu me basto como a luz tremeluzente da vela a rasgar a
noite escura. No percurso entre o nada e o oblívio, riscamos cintilantes o céu.
E mesmo que haja uma infinidade de sóis, a escuridão é o nosso quinhão.
Só eu me basto na tentativa inglória de me compreender. É a
fundamental incompreensão, que faz de nós estranhos aos outros. Mas o paradoxo
exige que para nos compreendermos precisemos dos estranhos, que nos hão-de
dizer na cara, coisas que nunca pensámos que pudéssemos ser. Coisas que
colidirão com a nossa dissonância cognitiva sempre presente e que por isso nos
magoarão de tão clamorosamente evidentes.
Só eu sou uma ilha solitária em voluntário exílio dos
outros. Porque há sempre um lugar a que regresso, dentro de mim próprio, onde
faço as pazes entre o que sou e o que pensava que era. É preciso tempo para lá
chegar e estar. Sair é sempre fácil.
Só eu me basto nesta mudez feita de uma floresta de
palavras. Crescem as árvores silenciosas e abrem os braços ao encontro da luz,
alimentam-se de sol e produzem sombra refrescante, numa folha de papel a traços
negros. Às vezes é terapia.
Só eu me basto nesta dança sem música das rotinas diárias.
Coisas repetidas porque a vida é ciclo que nos acaba por fartar e onde saímos
carregados de tédio, cansados do rodopio.
Só eu me basto quando nada é bastante, nas misérias de ser.